A autogestão, para uns, é um “método de gestão de empresas” e, para outros, é uma “forma política” que assume o comunismo, ou seja, a “democracia direta”. A primeira concepção deixa entrever a possibilidade de existir autogestão no interior da sociedade capitalista e a segunda apresenta a idéia de que é possível haver comunismo sem autogestão, já que esta é reduzida a uma mera “forma política” e, sendo assim, não é a essência do comunismo e por isto este poderia utilizar outras “formas políticas”. Entretanto, tal como pretendemos demonstrar no decorrer deste trabalho, estas concepções são equivocadas, pois não conseguem expressar o verdadeiro sentido da autogestão.
Antes de mais nada, tal como fizeram A. Guillerm e Y. Bourdet [1], é útil distinguir o conceito de autogestão de outras palavras que muitos pensam ter o mesmo significado. Autogestão não possui o mesmo significado que “participação” , “co-gestão”, “controle operário” ou “cooperativismo”. Vejamos o significado destas palavras:
A) PARTICIPAÇÃO: Participação não significa autogestão, pois ela significa participar de algo já existente, ou seja, de uma atividade que possui estrutura e finalidade próprias. Segundo Guillerm e Bourdet, o participante é como um flautista numa orquestra: participa se misturando individualmente à um grupo que lhe é preexistente.
B) CO-GESTÃO: A co-gestão é uma tentativa de integrar a criatividade e a iniciativa operária no processo produtivo capitalista (com o objetivo de aumentar a produtividade e, consequentemente, a extração de mais-valor relativo - ou mais-valia relativa) e que permite a participação dos trabalhadores apenas no processo de produção, nos meios e não nos fins. Mas mesmo essa co-gestão nos meios é limitada, pois a definição por outros sobre os fins leva à uma pré-determinação no que se refere ao meios.
C) CONTROLE OPERÁRIO: Segundo Guillerm e Bourdet, o controle operário significa um passo adiante em relação à co-gestão, mas ainda não é autogestão, pois o controle operário surge como produto de uma intervenção conflitual que arranca concessões para os trabalhadores, embora se limite a exercer-se sob pontos específicos que não questionam o salariato. Para M. Brinton, a proposta de “ controle operário” apresentada por diversos grupos políticos (principalmente leninistas e trotskistas) expressa a vontade de apresentarem-se como mais democráticos e fazem isto buscando nos iludir com a afirmação de que o leninismo sempre defendeu tal proposta. Para ele, o controle operário, ao contrário da autogestão, não significa que a classe operária irá gerir a produção e sim que ela irá “supervisionar”, “inspecionar” ou verificar as decisões tomadas por “instâncias exteriores” ao processo produtivo, tal como o estado ou o partido [2].
D) A COOPERATIVA: Segundo Guillerm e Bourdet, “esquematicamente, pode-se, com efeito, convir que (...), as cooperativas têm ‘vegetado’ sempre sob formas locais, a tal ponto que esta limitação se tornou seu sinal distintivo. Por isso, para designar a generalização dos sistemas de cooperativas, far-se-á mister uma palavra nova. O termo autogestão deve assumir o papel” [3]. Acontece que, no interior da sociedade capitalista, as cooperativas não determinam seus fins, pois o mercado e o estado sempre interferem nas finalidades de uma cooperativa e não só nos fins como, em menor grau, também nos meios.
Em síntese, a participação, o controle operário, a co-gestão e as cooperativas podem existir no interior do modo de produção capitalista e são assimiláveis por ele. O capitalismo envolve todas estas manifestações e as colocam sob sua direção, direta ou indiretamente. Não existem nem podem existir “ilhas de autogestão” cercadas pelo mar do capitalismo. A autogestão só pode existir em locais isolados por um curto período de tempo e em confronto com o capital e desta luta um dos dois vencerá, ocorrendo a destruição da experiência autogestionária ou a generalização da autogestão a nível nacional e posteriormente mundial.
Podemos dizer também que as definições acima deixam entrever que não existe muita diferença entre todos estes termos, pois todos eles possuem algo em comum: em todas essas formas de “participacionismo” permanece exterior aos trabalhadores a determinação dos fins e uma “co-determinação” no que se refere aos meios. Por conseguinte, o termo co-gestão engloba todos os outros termos e, sendo assim, ele é suficiente para marcar a diferença entre a autogestão e as outras formas de gestão que se dizem “democráticas”.
Mas o que é a autogestão? Como ela pode surgir e se expandir mundialmente? Em primeiro lugar, devemos reconhecer que é impossível compreender a autogestão e a possibilidade histórica de sua concretização sem compreendermos o solo onde ela pode brotar, ou seja, o modo de produção capitalista.
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